O relatório da Comissão Especial sobre Pessoas em Situação de Rua da Câmara de Joinville (SC), elaborado sob relatoria do vereador Mateus Batista (União), tem gerado desdobramentos em nível nacional. O documento, que analisa o avanço da população em situação de rua e propõe diretrizes para políticas públicas integradas, foi entregue a autoridades do Senado e da Câmara Federal e já inspira projetos de lei em outras capitais.
Com 206 páginas, o relatório aponta que Joinville registrou um crescimento de 754% no número de pessoas em situação de rua entre 2013 e 2023, saltando de 113 para mais de 960 pessoas cadastradas. O texto revela ainda que 42,37% dos entrevistados possuem histórico de dependência química e cerca de 90% não têm vínculos familiares ativos.
Durante a elaboração do material, a comissão ouviu representantes da saúde, assistência social, segurança pública e sociedade civil. O relatório destaca denúncias sobre o uso indevido de cartões do Bolsa Família por terceiros, em alguns casos ligados a organizações criminosas. As suspeitas foram reforçadas por relatos de pessoas em situação de rua abordadas pela equipe técnica.
O documento também faz críticas ao modelo atual do programa Bolsa Família, com base em estudos da FGV. Para os autores, a ausência de contrapartidas pode desestimular a busca por reintegração ao mercado de trabalho, especialmente entre os beneficiários em situação de rua. A recomendação é que o benefício venha acompanhado de um plano individual de acompanhamento, capacitação e tratamento.
Entre os exemplos positivos citados está o programa “Mão Amiga”, da cidade de Chapecó (SC), que reduziu em 88% a população em situação de rua local entre 2021 e 2024. A estratégia combina acolhimento, frentes de trabalho remuneradas e internação para reabilitação voluntária ou involuntária. Segundo dados do programa, cerca de 40% dos participantes conseguem se inserir no mercado formal de trabalho após a capacitação.
Inspirado por modelos internacionais como o Journey’s Home da Austrália, o relatório também defende ações de reintegração familiar voluntária. Essa abordagem já motivou a vereadora Amanda Vetorazzo (União), em São Paulo, a protocolar o projeto de lei “De Volta Para a Sua Casa”, com base no modelo citado no documento de Joinville.
No plano federal, o senador Jorge Seif (PL-SC) encaminhou o relatório à Comissão de Direitos Humanos do Senado, presidida pela senadora Damares Alves (Republicanos-DF), com sugestão de realização de audiência pública. Já o deputado Kim Kataguiri (União-SP) informou que irá protocolar um requerimento para convocar representantes do Ministério do Desenvolvimento Social.
Entre as recomendações do relatório estão:
- Criação de cadastro municipal interligado com dados federais;
- Ampliação de centros de acolhimento e reabilitação;
- Fiscalização do uso de benefícios sociais por pessoas em situação de rua;
- Integração entre saúde, assistência social, segurança e habitação;
- Desenvolvimento de programas de capacitação e inserção no mercado de trabalho.
A Prefeitura de Joinville recebeu o relatório oficialmente e o documento também será remetido a órgãos estaduais e federais.